segunda-feira, 28 de maio de 2007

COMO AS CRIANÇ ADQUIREM AS CONSOANTE FRICATIVAS

COMO AS CRIANÇAS ADQUIREM AS CONSOANTES FRICATIVAS

José Maria V. Maranhão e colaboradores

Este artigo tem por objetivo primordial equiparar pontos concernentes a língua falada, do ponto de vista do ensino tradicional da língua portuguesa e do ponto de vista fonético. Tem-se, especificamente, a intenção de analisar e estudar o uso, definição e classificação das consoantes fricativas, no sentido de ajudar educadores interessados em contextualizar a matéria de língua portuguesa, tendo como subsídio principal, os conhecimentos lingüísticos aqui descritos de maneira clara e eficiente, além de refletir sobre a maneira como as crianças adquirem, no meio familiar, as consoantes fricativas e como, na condição de educandos, poderiam entender um pouco mais sobre as consoantes fricativas e, assim, entender um pouco mais a própria língua.
Na atualidade, mesmo com a grande quantidade de informações lançadas para a sociedade, o professor ainda se consolida como figura indispensável no processo de aprendizagem. Em se tratando de temas como consoantes fricativas, é de fundamental importância que o professor possa compreender esse assunto, trazê-lo para a realidade dos alunos e fazer todas as separações necessárias para o bom atendimento dos mesmos. É bastante pertinente salientar também como os alunos, principalmente, das escolas afastadas da zona urbana, interagem com a escrita e a pronuncia das palavras, e quão grande é a dificuldade delas quando têm que se adequar às normas gramaticais. Nesta visão metodológica, vale lembrar dos conceitos de fonética, fonologia, além de reconhecer as consoantes fricativas, como elas são pronunciadas, onde algumas pronúncias variam e ressaltar a grande diversidade dialetal existente.
Sabemos que, mesmo com a grande quantidade de informações que bombardeia a sociedade diariamente, somos incapazes de manter em nosso discurso corriqueiro o mesmo padrão culto que exige a Gramática Normativa da Língua Portuguesa, por isso, fazemos adequações do nosso falar constantemente. Cada situação com a qual nos deparamos exige uma postura diferente, devemos nos comportarmos de maneira diferente e vestirmos roupas diversas, tanto quanto são diversas as ocasiões para usá-las. Com o falar acontece da mesma forma, em todos os momentos formais devemos manter um controle epilinguístico, principalmente na sala de aula.
O professor é peça fundamental do processo de ensino-aprendizagem, sobretudo pelo fato de ser ele um formador de opiniões. E se é um formador de opiniões, o é através de seu discurso, que é sua principal ferramenta de trabalho e numa visão mais ampla e politizado é um fator de redenção da sociedade. Em todas as ocasiões possíveis, é papel do professor transferir informações necessárias ao bom rendimento intelectual dos alunos, além de ser imprescindível uma concreta, eficaz e bem elaborada contextualização dos conteúdos. Contudo, devemos buscar em nossa comunidade características sócio-culturais marcantes que representem nosso jeito de viver. Para isso, nada mais importante do que o falar, que é a identidade maior de um povo.

No ensino de alguns “pontos” gramaticais, o discurso informal é uma arma metodológica bastante interessante, principalmente, em se tratando de alunos residentes em zonas rurais, de municípios pequenos e pobres, onde apresentam em sua linguagem natural, fortes traços regionais, crivados por palavras arcaicas e profundas variações dialetais. Aprender a norma culta, para eles, é um pouco mais complicado do que para aqueles que estão mais próximos dos centros urbanos ou dos multimeios de comunicação, pois têm um contato menor com esse tipo de fala.
“A partir da nova concepção da língua como DIASSITEMA, tornou-se possível o esclarecimento de numerosos casos de poliformismo, de pluralidade de normas e de toda inter-relação dos fatores geográficos, históricos, sociais e psicológicos, que atuam no complexo operar de uma língua e orientam à sua deriva. Condicionada de forma consciente dentro de cada grupo social e parte integrante de competência lingüística dos seus membros, a variação é, pois, inerente ao sistema da língua e ocorre em todos os níveis: fonético, fonológico, morfológico, sintático e etc. E usa multiplicidade de realizações no sistema em nada prejudica as suas condições funcionais”. (CUNHA, Celso & CINTRA, p.3).
Tendo por base Celso Cunha e Cintra, é possível que se ensine elementos construtivistas da gramática a partir da comparação com o discurso informal, isso por que todas as faces da língua estão inter-relacionadas.

Com relação ao estudo da Fonética, que pode ser entendida como a partir da lingüística geral que estuda e se interessa pelos sons da fala enquanto realidade física, além dos mecanismos de produção e recepção dos mesmos pelo organismo humano. Aproximando-se, por tanto, das ciências físicas e biológicas; e da Fonologia, que estuda os sons da fala do ponto de vista das funções que eles possuem dentro de um sistema lingüístico particular. (Soares, Mara, 1992. p.5). Podemos, então, perceber claramente que ao estudarmos os sons da fala temos que inicialmente dissociar as letras dos sons, por isso, às vezes, faz-se necessário a análise de um discurso, para que se possa entender todos os mecanismos que ocorrem involuntariamente durante o ato da fala.

A fonologia tem por tarefa determinar, entre os sons que ocorrem numa língua, quais são os fonemas (servem para distinguir palavras com significados diferentes, como por exemplo [p] e [b] em português pala e bala) e quais os que são alofones, ou variantes dos fonemas, como os sons diferentes da letra t em tia e tato, no português carioca. A fonologia atua num plano mais abstrato que a fonética, pois dois ou mais sons diferentes podem ser variantes do mesmo fonema, ou seja, um único fonema pode aparecer sob a forma de vários sons diferentes.

É bastante proveitoso, pedagogicamente, no momento que o professor, ao falar sobre o assunto, ilustra com palavras populares ou com a fala dos alunos a sua explicação, assim, diminuirá o grau de abstração do tema abordado.

As consoantes fricativas são formadas pelas letras que, ao serem pronunciadas, os articuladores se aproximam produzindo uma fricção. E a corrente de ar passa pela central, ou seja, passa bem no meio da boca. A obstrução que ocorre não é total e sim parcial.

Segundo Silva (2002, p.23) “As consoantes fricativas que ocorrem em português são: fé, vá, sopa, zapata, chá, já, rata que, em alguns dialetos, o som de R de “rata” pode ocorrer com um vibrante”.

As fricativas são classificadas segundo seu ponto de articulação e o lugar, como diz Silva (2002. p.37) “/f/ e /v/, são labiodentais, /s/ e /z/, dental ou alveolar, /s/, /z/ são alveolopalatais, /x/,/y/ são velares e /h/ e // são glotais”. Essas consoantes podem ter os sons uniformes em todos os dialetos do português brasileiro ou não. Como mostra Silva.
“Pata, bola, copa, gata, faca, vaca, são uniformes em todos os dialetos brasileiros. Tapa, data, ocorre em todos os dialetos brasileiros podendo ser alveolar ou dental. Sala, caça, paz, zapata, casa, uniforme em início de sílabas em todos os dialetos do português brasileiro, podendo ocorrer com articulação alveolar ou dental. Marca variação dialetal em fim de sílaba: paz, pasta, rasga, rata, marra, mar, carta. Pronúncia típica do dialeto carioca, ocorre fricção audível na região velar. Na pronúncia típica de Belo Horizonte não ocorre fricção no trato vocal. Ambas as pronúncias numéricas, ocorrem em início de sílabas que sejam precedidas pelo silêncio e, portanto, encontram-se em início de palavras como rata” (SILVA, 2002. p. 37 e 38).

Essas citações demonstraram que, em algumas pronúncias, existem uniformidade em todos os dialetos do português brasileiro, mas em outros isto não ocorre, mesmo em se tratando de letras iguais. A pronúncia pode ser diferente de acordo com o dialeto do individuo já que, o que está definindo esta diferença são os sons e não a representação gráfica, ou seja, as letras. A mudança de som é provocada, entre outros fatores, pela mudança do ponto de articulação que ocorre em algumas pronúncias.

Na maioria dos livros didáticos os exemplos sobre questões relacionadas com fonética e, mais especificamente, que trata sobre as consoantes fricativas, são de certo modo insuficientes. Para que se possa haver um estudo mais proveitoso, é preciso reconhecer as dificuldades, identidades culturais, e, a partir daí, entender como se fala, como se utiliza cada consoante fricativa, entre outros assuntos.

As fricativas ou construtivas, constituem a série mais numerosa de consoantes. Praticamente em qualquer parte da cavidade bucal pode haver estreitamento com produção de som fricativo. Começando do exterior para o interior temos em português:

[B] Caber, Baleio
[F] Faca, Fofo
[V] Cava, Vaca
[D] Fada, Cidade
[S] Sair, Raça
[Z] Zebra, Asa
[] Chá, Mexe
[J] Já, Gente
[X] Errado
[G] Carga, Barba
[H] Rio, Mar
[] Arma, Amarrado
[X] Rapaz, Carro
[Y] Corda, Arde


Outras fricativas não existem no português normal, são: [Ø] contra parte surda do [], [], chamada de “fricativa dental plana”, porque a língua apresenta a superfície plana, vista de frente. Ao contrário de [s, z, , ], em que a língua apresenta uma concavidade no centro, como uma canaleta, sendo por isso denominadas fricativas côncavas. O som [] e sua contra parte sonora [] são ás vezes chamadas interdentais, pois podem ser articulados com a língua entre os dentes incisivos superiores e inferiores. Mas, se a língua permanecer plana e atrás dos dentes incisivos superiores, o efeito acústico será praticamente o mesmo. O som [] pode ocorrer, como característica individual, como realização fonética do fonema [] em português: é o que se denomina ceceado . No inglês ocorrem tanto [] como [], ambos representados na grafia oficial pelo dígrafo th: [] the, that, those, them (o, aquele, aqueles, lhes); [] thing, think, earth, trough (coisa, penso, terra, através).

Pensando de uma forma mais metodológica voltada para o ensino de crianças, devemos destacar a diferença entre as letras e os seus respectivos sons, as diversas formas de se pronunciar uma mesma letra e as variações ou alofones, sem esquecer contudo das regras da gramática normativa.

Muitas vezes as crianças são levadas a acreditar que as letras são responsáveis e cumprem sua função de representar graficamente os sons da fala, por isso, desde os primeiros anos de colégio a criança vai trabalhando com fonemas, sem no entanto saber que o faz. Levando em consideração a relevância deste fato devemos além de dissociar a fala da escrita, trabalhar gradativamente noções gramaticais, principalmente da escrita.
CONCLUSÃO
Por tanto, estudar e lecionar sobre assuntos complexos como fonética ou consoantes fricativas, exigem um alto grau de abstração e contextualização, que se for trabalhado cedo facilitará bastante a aprendizagem ou abordagem futuras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, Thais Cristófaro. Fonética e fonologia do português: roteiro de estudo e guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 2002.
SOARES, Maria Aparecida Botelho Pereira. Iniciação à fonética. Sub-reitoria de ensino de graduação e corpo discente – Rio de Janeiro. 1992.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Faz e Terra, 2002.
PERINE, Mário A. Sofrendo a Gramática: Ensaios sobre a linguagem. Rio de Janeiro. Ática, 1997.
CUNHA Celso & CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

José Maria V. Maranhão. Mayumi P. Lopes, Rita Helena A. P. Fontenele e Veruska M. Sousa fazem parte do Grupo de Estudos Lingüísticos e Sociais (GELSO), coordenado pelo professor Vicente Martins, da Universidade Estadual Vale do Acaraú(UVA), em Sobral, Ceará.

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